Como o mercado REALMENTE resolve tudo

Quem construiu a Tebas de sete portas?
Nos livros estão nomes de reis:
Arrastaram eles os blocos de pedra?
E a Babilônia várias vezes destruída
Quem a reconstruiu tantas vezes?

Bertolt Brecht

 

Conforme relata o texto Pessoa-coisa, cidade-torre descobrimos que:

“Em 6 de dezembro de 2006, o então prefeito Gilberto Kassab aprovou a Lei Municipal n.14.223, que proíbe a colocação de anúncio publicitário nos imóveis públicos e privados, edificados ou não bem como a propaganda em outdoors. Conhecida como “Lei Cidade Limpa”, a medida, à época, fez com que as fachadas da cidade se tornassem menos visualmente poluídas, já que também regula o tamanho de letreiros e placas de estabelecimentos comerciais. No entanto, teve um efeito colateral: os anúncios imobiliários desceram dos postes e passaram a ser empunhados por seres humanos.”

 

Trata-se do “milagre dos mercados”, cuja caráter líquido, poroso, permite invadir todas áreas da atividade humana, e cada espaço do globo, como uma força incontornável comparável a gravidade.
Tal poder, no entanto, não está presente ele mesmo dentro de um pedaço de papel, o dinheiro.Afirmar isso, é claro, seria tão absurdo quanto dizer que um carro se move sozinho, por um fantasma, ignorando a gasolina que se encontra dentro dele.
Do mesmo modo, escondido por trás desse “milagre” do mercado, está o trabalhador que, para sobreviver, se deixa espremer, tal qual suco, enquanto sua vida escoa no seu local de trabalho. Ao processo de atribuir a objetos aquilo que é o produto da atividade humana, Marx chamou de “fetichismo da mercadoria”, enquanto que a exigência ao trabalhador de abdicar do controle consciente sobre si mesmo, Marx deu o nome de “alienação” assim como mais tarde “trabalho abstrato”.

Algumas vezes, os próprios capitalistas ficam tão vidrados no dinheiro que se esquecem do “fator trabalho” agindo debaixo dos panos: vide o recente caso das greves dos policiais em Espírito Santo , onde o Fecomércio local “aprendeu” na prática que sem uma “mãozinha” do exército e a polícia militar se encontram reduzidos à impotência.
No fantástico texto A Reprodução da Vida Cotidiana, Fredy Perlman nos explica:

“Nas pinturas dos economistas, os anjos, trabalhadores celestiais, fazem tudo e os homens nada fazem. Os homens simplesmente gozam o que os anjos fazem para eles. Não apenas o Capital produz e o dinheiro trabalha; outros misteriosos seres possuem virtudes similares.”

E mais adiante:

” As atividades da vida cotidiana são desempenhadas pelas coisas, e as pessoas são reduzidas à coisas (‘fatores de produção’) durante suas horas ‘produtivas’ e em espectadores passivos de coisas durante o seu tempo de lazer. O mérito do economista consiste em atribuir o produto da atividade cotidiana das pessoas às coisas e em não ver a atividade das pessoas por trás da extravagância das coisas. Para o economista, as coisas (por meio das quais a atividade das pessoas é regulada pelo capitalismo) são elas mesmas mães e filhos, causas e efeitos de sua própria atividade.”

Para mostrar o absurdo disso vamos usar um exemplo simplificado.Imagine que eu tenha notas de uma moeda chamado valia, digamos, “10 valias bolso”. Eu me aproximo de ti então e digo: “veja, trabalhe para mim quatro horas plantando,e então eu te devolvo 5 valias”. Você me pergunta então: “mas para que eu preciso dessas notas, as 5 valias”? E eu digo: “para comprar uma parte do que eu produzi, por 3 valias”.
Repare que eu não “produzi” nada: o que eu fiz foi pegar um pedaço de papel, uma “licença”, que veta a atividade humana, e então direcioná-la ao meu próprio interesse. O que o trabalhador “compra” de mim não foi nada mais do que uma parte do que ele mesmo havia previamente produzido! Tal situação, é claro, é absurda e, no entanto, é desse absurdo (esse dogma) que consiste nossas vidas todos os dias.

 

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