O Trabalho e a alienação da Vida

Quanto tempo do seu dia você dedica ao seu trabalho? E quanto tempo você dedica a sua vida? Quantas horas você passa fazendo o que quer fazer e quantas passa fazendo o que tem que fazer? Quanto tempo você passa sendo um personagem, uma empresa, um profissional e durante quanto tempo você é uma pessoa por si, com desejos, paixões, ódios e amores?
Na rotina, vida e trabalho se confundem, e as necessidades da vida nos levam a ser uma personagem, um profissional, em tempo integral. Essa persona, alheia a nós como indivíduos em si, se embrenha como um parasita nos roubando a nossa própria existência, a nossa própria criatividade, até que o simples ser seja um ato profissional. Então estamos prontos para ver aqueles que não podem (por razões socialmente determinadas) participar desse teatro armado para nós pelo capital como párias, divergentes, vagabundos… E assim, armamos para eles um papel dentro do nosso teatro, os forçando a participar dele, os jogando nas beiras do palco da vida real enquanto nos imaginamos num pódio mais elevado, os olhando com desprezo afinal, é esse o nosso roteiro. Podemos ser caridosos e lhes estender as mãos ou simplesmente ignorar a sua existência. Podemos lutar para que eles tenham a oportunidade de subir no pódio conosco ou buscar simplesmente buscar aumentar nossos própios pódios, mas não podemos deixar de participar do espetáculo. Nisso, somos iguais: Todos dançando conforme a música, inertes a nossa realidade.
Não se trata de uma escolha para nós, o ato ritualístico do trabalho é condição de sobrevivência. Dançar no nosso pódio a música que está tocando é o que nos garante estarmos vivos. Física e socialmente. O medo de cair nos impele a dançar mais e mais e nessa dança, já não somos nós! Somos o profissional competente, o comprador consciente, o cidadão de bem…
Gerações passadas tiveram conquistas, limitaram o trabalho a um canto, um campo separado da vida, mas foi essa divisão que os derrotou. É essa divisão que nos derrotou. O trabalho, como manifestação da própria existência separada e alheia a ela, diluiu em décadas as conquistas de nossos antepassados e as desfez, permitindo ao espetáculo que as absorvesse tranquilamente. A jornada de oito horas de trabalho, pauta de grandes greves gerais do passado, hoje já se expande para dentro da vida do trabalhador de diversas formas, e essa divisão, que antes serviu de motor para tanta luta, hoje se desfaz e dispersa as perspectivas da libertação da humanidade desse espetáculo sanguinário.

 

Leia mais sobre essas ideias em: O crepúsculo das personificações, de Fredy Perlman

This entry was posted in Artigos, Contra o Trabalho. Bookmark the permalink.